Júnior Santos
Nos lixões do interior, como em Caicó, não é difícil flagrar o descarte de medicamentos e lixo hospitalar
No Brasil, cerca de 60% dos resíduos de saúde coletados são descartados de maneira inadequada, em locais impróprios, trazendo risco à saúde pública, segundo a Associação Brasileira de empresas de Limpeza Pública (Abrelpe). Clébio Azevedo, diretor da Serquip no RN - recentemente vendida para a Sterecycle e única autorizada a tratar o lixo hospitalar do estado - acredita, entretanto, que o índice no RN seja menor. Segundo ele, 80% dos 'resíduos de serviços de saúde' produzidos pelo estado são incinerados pela empresa.
Segundo a Abrelpe, cerca de 2,3 mil toneladas de lixo hospitalar são recolhidas por ano no RN. A quantidade representa 1% de todo lixo hospitalar recolhido no País. Os dados são do Panorama de Resíduos Sólidos no Brasil - 2010. O percentual de municípios que enviam lixo hospitalar para lixões a céu aberto no Rio Grande do Norte - quase quatro vezes maior que o do Nordeste e o do Brasil - preocupa, afirma Maria Auxiliadora Barros, do Departamento de Serviços de Saúde, da Subcoordenadoria de Vigilância Sanitária do RN (Suvisa/RN). "O descarte de resíduos de serviços de saúde de forma inadequada e em locais inapropriados pode ferir e infectar catadores e poluir o meio ambiente", explica.
A Suvisa, explica Auxiliadora, fiscaliza os hospitais potiguares com frequência. Quando detecta alguma irregularidade, autua e exige que o hospital dê o destino correto aos seus resíduos. O Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema), por sua vez, diz fiscalizar a unidade de tratamento da Serquip, única autorizada a atuar no ramo.
Dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico mostram que 63% dos municípios brasileiros possuem coleta de resíduos de serviços de saúde. Deste total, 18% utilizam algum tipo de tecnologia de tratamento; 36% queimam o lixo hospitalar a céu aberto e quase 35% não adotam qualquer tipo de tratamento. "Estudos de saneamento ambiental indicam uma carência de utilização das técnicas corretas de disposição dos resíduos em solo", afirmou o técnico da Gerência de Infraestrutura em Serviços de Saúde da Anvisa, Luiz Carlos da Fonseca e Silva, ao Portal Saúde, do Ministério da Saúde.
Catadores denunciam descarte irregular
Caicó, a 267 km de Natal, era um dos municípios potiguares que não tratavam o lixo hospitalar. Algumas unidade de saúde, como o Hospital Regional, até incineravam seus resíduos, entretanto, boa parte do lixo proveniente de clínicas, hospitais e unidades municipais de saúde ia parar no lixão da cidade. Hoje, os resíduos são coletados e tratados pela Serquip. Catadores que vivem no lixão afirmam, entretanto, que parte do lixo hospitalar da cidade ainda é descartado no local.
"Vem sim para cá. Eles (os motoristas das caçambas de lixo) queimam logo. Não deixam a gente chegar perto", afirma um dos catadores, que não quis se identificar. Ele mesmo já se feriu. Pisou numa seringa e precisou retirar a agulha que entrou no pé. Não foi ao hospital, porém. Desinfectou o ferimento com iodo, cujo frasco também encontrou no lixão.
"A gente encontra seringa, soro, luva. O homem que traz o lixo queima na mesma hora", afirma outro catador, que vive no lixão há um ano. O 'homem que traz o lixo', cujo nome será preservado, é motorista da Prefeitura de Caicó e nega o descarte irregular. "Eu trago apenas lixo comum do hospital", explicou, visivelmente nervoso.
A equipe de reportagem, que vasculhou o lixão, não encontrou nenhum 'resíduo de serviço de saúde' no local. Segundo os catadores, o lixo havia sido descartado e queimado na semana anterior.
O diretor do Hospital Regional de Caicó, Nildson Dantas, reforçou a versão do motorista. Segundo ele, apenas o lixo comum é descartado no lixão. "O infectante, é acondicionado em recipientes especiais e recolhido pela Serquip uma vez por semana. Não tenho conhecimento de descarte irregular em Caicó. O último caso foi registrado há quase dez anos, quando o assunto começou a ser discutido na Câmara de Vereadores", afirmou Nildson. Os catadores defendem sua versão. "A verdade cabe em todo lugar", diz um.
Tribuna do Norte
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