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domingo, 11 de dezembro de 2011

Manancial seridoense em risco

As águas do açude Marechal Eurico Gaspar Dutra, em Acari (201 km de Natal/RN), mais conhecido como Gargalheiras, a terceira maravilha do Rio Grande do Norte, têm a cor da poluição. Nessa época do ano, do alto do açude, se observa uma mancha verde nas margens do reservatório, resultado, segundo pesquisadores, da eutrofização do manancial [multiplicação de microorganismos aquáticos]. De perto, quando se coleta um pouco dessa água, o aspecto amarelado levanta suspeitas de que a qualidade não é boa.

As águas do açude Gargalheiras estão contaminadas, segundo pesquisadores e estudiosos da região, e a nascente dessa poluição está a pouco mais de 15 km, no  município de Currais Novos, cidade que tem hoje, somente na zona urbana, 37.777 habitantes e onde o tratamento de esgotos é ineficiente.  Os dejetos coletados [segundo dados da Caern em cerca de 81% dos domicílios] são represados em lagoas de estabilização obsoletas, construídas há quase 20 anos, e desgastadas pela ação do tempo.

De lá, os efluentes são lançados praticamente "in natura" no leito do rio São Bento, que corta a cidade de Currais Novos e desagua no rio Acauã, principal afluente da bacia do Gargalheiras. Na quarta-feira, 07, a reportagem da TRIBUNA DO NORTE visitou uma das estações de tratamento de esgoto, a ETE Mané-Mago, nas proximidades do bairro Gilberto Pinheiro, e constatou que no entorno da estação existem canais - espécie de córregos, que carreiam toda a carga de efluentes sanitários para o leito do rio.


Júnior Santos Poluição no açude Gargalheiras
Poluição no açude Gargalheiras

Em, pelo menos, 500 metros dessa área, percorridos pela reportagem, o que se viu foi um "riacho" de fezes. As águas servidas que descem canal abaixo são pesadas, de cor muito escura e fétidas. A fedentina polui o ar e incomoda. Em vários trechos o acúmulo de matéria orgânica é visível a olho nu. Segundo moradores ouvidos pela reportagem os canais que passam pela fazenda onde está localizada a ETE Mané-mago terminam no leito do rio, que por ser intermitente, está seco essa época do ano.

Ao longo de seu curso, além de efluentes provenientes do esgotamento sanitário, o rio São Bento recebe resíduos químicos e hospitalares, detergentes, saponáceos e rejeitos da agropecuária. O problema é antigo. Desde 2007, pesquisadores e estudiosos da região denunciam a contaminação das águas do rio e do açude Gargalheiras e reclamam da ausência de soluções concretas.

Nas últimas semanas, durante audiências públicas e reuniões, realizadas nos municípios de Acari e Currais Novos, o debate foi retomado. Vereadores, representantes dos dois governos municipais e do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia [ Campus de Currais Novos] decidiram pela criação de uma Comissão Permanente de Luta contra a poluição do Rio São Bento e do Gargalheiras.

Formada por dez membros, a comissão terá a missão de elaborar um relatório técnico, com pesquisas in loco e coleta das águas do rio São Bento e do açude Gargalheira para análises laboratoriais. A comissão quer produzir um relatório ambiental que atualize as informações quanto à qualidade das águas do rio e do açude, comprovando ou não a contaminação.

Dois estudos elaborados por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte [um finalizado em 2006 e outro de 2009] constataram altos índices de cianobactérias nas águas do Gargalheiras. Esses organismos produzem cianotoxinas, que podem causar vários males à saúde humana. Em algumas amostras, o índice chegou a ser até quatro vezes maior do que o limite tolerável.

Pela resolução 357, do Conama a densidade de cianobactérias não pode ser maior que 20.000 células/ml, e se vier a ultrapassar o limite a legislação  exige amostragem semanal para verificação da ocorrência de cianotoxinas. Nas últimas coletas no Gargalheiras [2009], apesar da sangria ocorrida neste ano, a densidade de cianobactérias estava em mais de 70.000 células/ml. Antes da sangria a densidade era de 280.000 por ml, segundo dados de pesquisas realizadas à época, por mestrandos da UFRN.

Pesquisador alerta para os riscos

Embora não exista relatório atualizado que comprove a contaminação das águas do Gargalheiras, quem defende a despoluição, desde 2007, aponta  a eutrofização do manancial, vista a olho nu, como um potencial problema de saúde pública. O professor de Biologia Celton de Moura, do IFRN [Campus de Currais Novos] é um dos pesquisadores da contaminação das águas do Gargalheiras.

Ele afirma que são vários os fatores de poluição. Além do esgoto, disse ele, tem-se o problema dos defensivos agrícolas, dos rejeitos da  indústria de mineração; da agricultura e da pecuária, que são levados para as águas do Gargalheiras, nos períodos de chuva. Também se discute a degradação devido à ocupação desordenada no entorno do Gargalheiras, sem o controle do rejeito de esgoto.

Mas o ponto principal de poluição é a entrada de efluentes de Currais Novos. "As populações ribeirinhas de Acari tem pontos de contribuição para a poluição local, mas é de menor impacto". Não dá, segundo Celton de Moura, para responsabilizar uma ou duas edificações, quando uma cidade inteira, como Currais Novos, lança seus dejetos praticamente in natura no leito de um rio que desagua no Gargalheiras. "É uma discrepância alta".

Moura descarta a contaminação, em níveis elevados, das águas do açude por metais pesados e resíduos agrotóxicos. "Ela existe, sim, mas não chega a níveis inaceitáveis. Caso contrário já teríamos casos de intoxicação, principalmente entre a população pobre que não teria condições de comprar água mineral", explicou. A prioridade a seu ver deve ser o controle biológico. Celton alertou que as autoridades municipais precisam  de forma urgente acionar mecanismos para que a Caern dê um destino a esse esgoto.

Margareth Grilo - Repórter especial

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